Leitura ativa da novela: O Alienista
Antes de assistir ao vídeo, leia o primeiro capítulo do Alienista de Machado de Assis, clicando aqui!
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Abaixo, o texto da videoaula:
Leitura ativa do: “O Alienista” de Machado de Assis
Muitas pessoas acham que os livros escritos por Machado de Assis são chatos, as frases são complicadas e que ele usa muitas palavras que não sabemos exatamente o significado. Pelo menos, era isto o que eu pensava até um amigo me contar porque ele gostava desse escritor e como ele entendia o que lia. Esse amigo me fez uma proposta: eu deveria ler O Alienista, pensar sobre o texto e aí decidir se eu mudava ou mantinha a minha opinião. Fiz o que ele sugeriu, e adorei o livro.
Neste vídeo vou mostrar para vocês o que penso enquanto leio um trecho do livro e o que faço quando encontro palavras e expressões que não compreendo. Mesmo um leitor competente pode ter dúvidas sobre o significado de palavras, expressões e mesmo parágrafos inteiros! Nessa hora é preciso ter paciência, procurar o significado das palavras e expressões difíceis e ler o trecho mais de uma vez. Não vale a pena continuar a leitura sem entendê-la.
Leio os títulos do livro e do primeiro capítulo:
O ALIENISTA
Capítulo I: DE COMO ITAGUAÍ GANHOU UMA CASA DE ORATES
Não tenho certeza sobre o que será esta história, pois tenho algumas dúvidas sobre o que acabo de ler. O que é “alienista”? “Itaguaí” é um uma cidade? Onde fica? O que é “Orates”? Será que é o nome de um personagem? E o que significa “Casa de Orates”? É onde esse personagem mora? Só com estas informações eu não sei sobre o que será o livro. Antes de continuar minha leitura decido procurar as respostas para estas perguntas. Para isso, irei pesquisar em sites de busca na internet e em um dicionário1.
No dicionário, descubro que “alienista” é um médico que trata de doenças mentais, um psiquiatra. No mesmo dicionário encontro a definição de “orate: Indivíduo sem juízo; louco, doido”. Então “casa de orates” é uma casa de loucos, e não de um personagem chamado Orates? Pesquiso mais um pouco e descubro que essa expressão é um sinônimo para hospício.
Ainda falta saber o que é Itaguaí. Em um site de procura da internet descubro que é uma cidade e, ao olhar num mapa, vejo que ela fica no litoral do estado do Rio de Janeiro, entre Angra dos Reis e a capital.
Depois dessas descobertas imagino que o livro será sobre um psiquiatra envolvido na abertura de um hospício em Itaguaí no século XIX, pois o livro foi lançado em 1882. Com esta expectativa, finalmente começo minha leitura!
Logo no primeiro parágrafo descubro algumas informações sobre o personagem principal. Seu nome é Dr. Simão Bacamarte,acho que ele nasceu em Itaguaí, pois é filho da nobreza da terra, e estudou medicina na Europa. Quando leio que os cronistas da vila de Itaguaí o consideram: “o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas” percebo que ele deve ser um profissional competente. Ao ler a frase: “Aos trinta e quatro anos regressou ao Brasil, não podendo el-rei alcançar dele que ficasse em Coimbra, regendo a universidade, ou em Lisboa, expedindo os negócios da monarquia”, tenho a impressão de que o Dr. Simão é um profissional competente, patriota e que deseja mudar o mundo, ou seja, um idealista.
Essa impressão fica mais forte quando leio o que ele disse ao rei, suponho que seja o rei de Portugal: “— A ciência, disse ele a Sua Majestade, é o meu emprego único; Itaguaí é o meu universo”.
Leio a primeira frase do próximo parágrafo: “Dito isso, meteu-se em Itaguaí, e entregou-se de corpo e alma ao estudo da ciência, alternando as curas com as leituras, e demonstrando os teoremas com cataplasmas”. O trecho “demonstrando os teoremas com cataplasmas” chama a minha atenção. Qual é a relação entre teoremas e cataplasmas? Aliás, o que é “cataplasma” mesmo?
Sempre associei a palavra teorema com a Matemática, como o Teorema de Pitágoras. Antes de continuar, vou mais uma vez consultar um dicionário, pois o que matemática teria a ver com a história de um psiquiatra? Encontro a seguinte definição: “Proposição que, para ser aceita como evidente, precisa ser demonstrada”. Então entendo que essa palavra pode ser usada quando temos uma ideia que precisa ser verificada de alguma maneira, e só então esta ideia será aceita ou rejeitada.
A palavra cataplasma me faz pensar nos medicamentos que os médicos receitavam aos pacientes e eram preparados em uma farmácia. Mas que tipo de medicamento é um cataplasma? Depois de pesquisar descubro que é uma substância pastosa que é aplicada sobre alguma parte do corpo. Começo então a imaginar como é a personalidade do Dr. Bacamarte. Ao ler o trecho: “e entregou-se de corpo e alma ao estudo da ciência, alternando as curas com as leituras” tenho a impressão que ele é muito envolvido com o trabalho, mas não se satisfaz apenas usando o que já sabe para tratar seus pacientes. Está constantemente estudando e verificando se o que ele lê nos livros funciona ou não na prática. Mas os seus pacientes têm que tipo de doença? Sobre o que exatamente são os livros que ele lê? Afinal, a medicina tem várias especializações e até o momento não é dito no que exatamente o Dr. Bacamarte trabalha. Continuarei a leitura, talvez encontre a resposta a esta pergunta.
Quando leio: “... senhora de vinte e cinco anos, viúva de um juiz de fora, e não bonita nem simpática...” e “... estava assim apta para dar-lhe filhos robustos, sãos e inteligentes...”, descubro os motivos que o Doutor Bacamarte usou para escolher sua esposa, Dona Evarista. Ele não quer nenhum tipo de distração do seu trabalho e de seus estudos! Acho isso perturbador, não ter nenhum tipo de afeição ou admiração pela pessoa com a qual se decide dividir a vida! Acho este personagem tão diferente de mim, não sei se vou gostar dele...
Depois de ler este parágrafo, começo a imaginar como é a personalidade do Dr. Bacamarte. Tenho a impressão que é um médico competente, mas não parece se identificar com seus pacientes. É sem dúvida estudioso e extremamente racional.
Mas até o momento não sei como é sua aparência física. É gordo ou magro? Alto ou baixo? Usa bigode? Barba? É careca? Apesar disso, começo a pensar como ele seria... Imagino um homem vestido de maneira discreta, sempre com ternos escuros, camisas brancas e gravatas elegantes. Acho que ele é magro, não acredito que ele seja capaz de apreciar uma boa refeição com a família ou os amigos, deve comer em horários regulares apenas para se manter saudável, sem ter muito prazer com as refeições. Preciso ler mais para verificar se estas suposições estão corretas.
Ao ler: “Dona Evarista mentiu às esperanças do Dr. Bacamarte, não lhe deu filhos robustos nem mofinos”, descubro que Dona Evarista não teve filhos. Tenho a impressão que o Dr. Bacamarte realmente queria ser pai, mas tanto essa vontade e como ele reage a isso me dá uma sensação de estranheza com este personagem. Querer ser pai mostra seu lado humano e terno, que está tão em desacordo com seu comportamento e maneira de pensar. Parece que ele tem problemas em conciliar seus sentimentos e sua razão. É como se para ele tudo se reduza a criar hipóteses, pesquisar, coletar e analisar dados e finalmente a chegar a conclusões. Ou seja, é sempre o cientista reagindo e analisando! Como uma pessoa com este tipo de personalidade consegue conviver com a esposa, os pacientes e amigos? Lerei mais um pouco para ver se encontro a resposta a essa pergunta.
Quando leio: “Mergulhou inteiramente no estudo e na prática da medicina. Foi então que um dos recantos desta lhe chamou especialmente a atenção, — o recanto psíquico, o exame de patologia cerebral.”, encontro a reposta a uma das perguntas que tinha feito anteriormente: que tipo de médico é exatamente o Dr. Bacamarte? Ele parece ter tido uma formação mais geral, mas se dedica a psiquiatria. Então continuo a leitura: “— A saúde da alma, é a ocupação mais digna do médico”. Finalmente sinto um pouco de simpatia pelo Dr. Bacamarte. Apesar de parecer sempre frio e racional ele se entusiasma com alguma coisa, demonstrando uma verdadeira paixão pelo trabalho que se propõe fazer! Como será que o Dr. Bacamarte tratará as pessoas? Ele conseguirá entendê-las e se interessar por elas? Ou ele vai manter sua postura racional o tempo todo?
Ao ler um novo parágrafo encontro a frase: “A vereança de Itaguaí, entre outros pecados de que é arguida pelos cronistas, tinha o de não fazer caso dos dementes”. Mas o que é “vereança”? Depois de recorrer ao dicionário descubro que são os vereadores. E “arguida”? Esta palavra está relacionada com o verbo arguir, e significa acusar. Entendi! Arguida é a mesma coisa que acusada! Na segunda frase desse mesmo parágrafo o autor deixa claro que as pessoas com problemas mentais não recebiam nenhum tipo de tratamento. Nesta frase tanta coisa é dita nas entrelinhas! Machado de Assis está criticando os vereadores de sua época, sugerindo o desdém dos mesmos sobre tantos assuntos importantes para a população. Isso foi escrito no século XIX, fico triste ao pensar que a mesma crítica ainda pode ser feita em algumas situações...
Parece incrível, este personagem que inicialmente achei tão frio e racional consegue perceber um problema na cidade que ele ama. Sabendo que ele tem condições de ajudar a resolver essa situação com seu trabalho e conhecimento, se propõe a agir! Então essa será a Casa de Orates anunciada no título do capítulo? Acho que sim...
Estou muito curiosa para saber o que vai acontecer. O Dr. Bacamarte conseguirá abrir sua Casa de Orates? Como a população vai reagir se ela for aberta? A dona Evarista apoiará o marido? Quem irá ajudar o Dr. Bacamarte em seu projeto? Será que o médico será vencido pelas pessoas que se opõe a sua proposta? A Câmara de Vereadores ajudará financeiramente os pacientes que não puderem pagar pelo tratamento? Como será feito o tratamento dos doentes? Quais são os sintomas que eles apresentam?
Para descobrir preciso terminar de ler o livro. Pronto, a história já me envolveu de tal maneira que eu fico ansiosa para continuar a leitura! E você?
1 Dicionário consultado na internet: Caldas Aulete: http://www.aulete.com.br/
Cristiane Roldão