Uma Vida de Contribuições
Em consequência das dificuldades experimentais encontradas nas pesquisas realizadas durante seu doutoramento, Reiko achou mais oportuno dedicar-se ao ensino de Química. Além disso, julgou que, através da melhoria do ensino, poderia dar uma retribuição melhor à sociedade, que patrocinou sua formação acadêmica e profissional durante muitos anos. Ela manifestou esse interesse, sendo, assim, indicada representante nacional do Comitê de Ensino de Química (mais tarde denominado Comitê de Educação Química) da União Internacional de Química Pura e Aplicada (Iupac, na sigla em inglês), em virtude da nomeação de Giesbrecht, que era representante nacional, para membro desse Comitê. Representantes nacionais têm a função de divulgar as deliberações do Comitê entre a comunidade interessada do respectivo país, no caso os educadores químicos brasileiros. Não são convidados para as reuniões, mas apenas informados a respeito das discussões havidas. Reiko, porém, demonstrando grande interesse pelas atividades do Comitê, uma vez nomeada representante nacional, participou de todas as reuniões, com recursos próprios. E fez mais: implantou no Instituto de Química todos os projetos discutidos nas reuniões. Essa foi uma iniciativa notável, pois, na maioria das vezes, nem membros do Comitê, mesmo de países mais desenvolvidos, levam as discussões tão a sério. Dessa forma, ao chegar para a reunião seguinte, Reiko sempre tinha pronto um relatório das atividades realizadas em São Paulo.
O primeiro desses projetos foi de aparelhos de baixo custo para o ensino de Química. Naquela época, início dos anos 1980, a construção de equipamentos eletrônicos tinha se tornado relativamente simples, devido à disponibilidade dos circuitos integrados. Assim, leigos em eletrônica poderiam, com pouco treinamento, construir aparelhos. Surgiu na Iupac a ideia de realizar workshops em que os participantes montariam um aparelho de baixo custo e o reproduziriam em seus locais de trabalho, dispondo, assim, de equipamentos suficientes para que seus alunos tivessem aulas práticas em que todos, efetivamente, pudessem manuseá-los. Reiko e Giesbrecht encomendaram o desenvolvimento de um aparelho de quatro funções (condutímetro, potenciômetro, colorímetro e termômetro) à Fundação Brasileira para o Ensino de Ciências, da qual ambos eram conselheiros. O primeiro workshop foi realizado em julho de 1983, com a participação de professores brasileiros e de vários países da América Latina. Seguiram-se mais dois workshops, em 1984 e 1985.
Outro projeto foi a produção do livro Experiências sobre Equilíbrio Químico, no qual Reiko coordenou uma equipe de 20 autores. Essa obra consiste na descrição de vários experimentos sobre equilíbrio químico, cuja principal característica é a exploração exaustiva dos resultados de cada experimento, o que normalmente não ocorre, levando a um desperdício de informação. O livro foi publicado em 1985, com o patrocínio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Em fevereiro de 1986, foi oferecido um curso de extensão universitária a professores do ensino médio, que realizaram vários dos experimentos descritos no livro. Em 1987, ele foi traduzido para o inglês, com o título de Experiments on Chemical Equilibrium, com apoio financeiro da Unesco.
Um terceiro projeto consistiu numa disciplina optativa oferecida aos alunos do curso de Química da USP, Fundamentos de Segurança e Higiene do Trabalho em Laboratórios de Química. Para isso, Reiko contou com a ajuda de docentes do Instituto de Química e de especialistas em segurança da Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho, vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego).
Entre 1986 e 1989, Reiko organizou as primeiras olimpíadas de Química do Estado de São Paulo. A iniciativa e a coordenação geral foram de S. Watanabe, secretário geral da Academia de Ciências do Estado de São Paulo. Essas olimpíadas, feitas nos moldes das olimpíadas internacionais de Química, não tiveram continuidade devido à dificuldade de obter financiamento para sua realização. Foram mais tarde retomadas pela Associação Brasileira de Química, sob coordenação de I. Gutz do Instituto de Química da USP, continuando até hoje.
Em 1985, Reiko foi convidada a proferir palestra plenária na 8a Conferência Internacional de Educação Química (8a ICCE), que seria realizada em Tóquio, em agosto daquele ano. Essas conferências, que ocorrem de dois em dois anos, são patrocinadas pela Iupac. Em seguida à conferência, houve a reunião do Comitê de Ensino de Química da Iupac, em Lyon, França, na qual o Brasil foi escolhido sede da 9a ICCE, sendo Giesbrecht seu presidente; e Reiko, a secretária geral. Seguiram-se dois anos de intensos trabalhos, com a obtenção de recursos financeiros, a divulgação da conferência a potenciais participantes do mundo todo, o convite aos palestrantes, a reserva de hotéis e das instalações da conferência, a produção do livro de resumos dos trabalhos que seriam apresentados, a elaboração de temas a serem discutidos em pequenos grupos e a resolução de uma infinidade de outros problemas, típicos da organização de um evento desse porte. Reiko, a quem coube a maior parte da responsabilidade da organização, contou com a ajuda de professores do Instituto de Química da USP e de familiares, em particular, Yumi Isuyama e Yuri Kobashi. Em 25 de julho de 1987, ocorreu a abertura da 9a ICCE, seguindo-se uma semana muito proveitosa. O êxito da conferência, que contou com 516 participantes de 35 países, deve ser creditado ao empenho de Reiko durante os dois anos de preparação. O trabalho, porém, não acabou com a cerimônia de encerramento. Ainda foram produzidos os anais da conferência, em inglês, contendo o texto das palestras plenárias, resumos das discussões em grupo, lista de participantes e outras informações sobre o evento, o que consumiu mais um ano.
Com o término do mandato de Giesbrecht como membro do Comitê de Ensino de Química da Iupac, Reiko foi eleita para esse cargo. Não é comum um comitê da Iupac ter seguidamente um membro de país do terceiro mundo, de modo que esse foi, certamente, um feito extraordinário, inteiramente devido à atuação de Reiko nesse Comitê, quando ainda era representante nacional e ao grande sucesso na organização da conferência.
Simultaneamente à incumbência de organizar a 9a ICCE, Reiko recebeu convite de David Waddington, professor da Universidade de York, Reino Unido, e líder do grupo de educação química dessa universidade, além de presidente do Comitê de Ensino de Química da Iupac, para estagiar em seu grupo. O momento, porém, era inoportuno: antevendo-se intensa atividade na organização da conferência, era desaconselhado o afastamento de Reiko dos trabalhos no Brasil. Por isso, ela declinou o convite. Este, no entanto, continuava válido após a conferência, de modo que, em janeiro de 1989, a professora partiu para um estágio de dois meses em York. O grupo de Waddington produzia módulos para o ensino de Química, baseados na indústria química local, projeto que Reiko analisou detalhadamente em seu estágio. Retornando ao Brasil, ela estabeleceu um convênio entre as duas universidades, York e USP, para o intercâmbio de docentes, com a finalidade de desenvolver material didático baseado na indústria química brasileira. Já em outubro desse ano, veio ao Brasil o primeiro professor do grupo de educação de York, John Garratt. Com ele, foram visitadas as empresas Rhodia e Tintas Coral, iniciando-se a elaboração de duas unidades didáticas [o que são “unidades didáticas”? Livros?], uma sobre produção de hidrogênio para a fabricação de nylon; e outra sobre tintas látex, com ajuda de pessoal das empresas visitadas. Nos anos que se seguiram, um bom número de unidades foi elaborado, sempre com visita a empresas relacionadas com o tema da unidade. Elas foram usadas em workshops em disciplinas regulares do Instituto de Química da USP e em outras universidades. Também foram elaboradas unidades simplificadas para treinamento de professores do ensino médio. Vários professores de York estiveram no Brasil, destacando-se Gordon Fettis, que, ao se aposentar na Imperial Chemical Industries, passou a integrar o corpo docente de York. Com sua grande experiência industrial, foi de enorme valia no projeto.
O convênio entre a Universidade de York e a USP foi estendido para a pesquisa e resultou em algumas outras iniciativas. Assim, de 7 a 12 de dezembro de 1997, Reiko organizou a 2a ICIEC (International Conference on Industry/Education Cooperation), na Escola SENAI Mario Amato, em São Bernardo do Campo, que contou com a presença de vários professores de York.