Penso, logo existo
“Penso, logo existo” é uma frase do filósofo francês René Descartes, que marcou a visão do movimento Iluminista – ocorrido na Europa do século XVIII e palco de grande desenvolvimento da Ciência e da Filosofia. Ele parece ter chegado à conclusão da célebre frase ao traçar uma metodologia para definir o que seria o verdadeiro conhecimento. Para ele, todas as teorias científicas acabavam por ser refutáveis e substituídas por outras. Não havia nenhuma certeza verdadeira, além da dúvida. René Descartes passou, então, a duvidar de tudo, pois entendeu que, ao duvidar, estava pensando, e, por estar pensando, ele existia.
Tempos depois de Descartes, surge o conhecimento científico, pois o ser humano tem a necessidade de querer saber como as coisas funcionam ao invés de apenas aceitá-las passivamente. O conhecimento científico proporcionou ao homem começar a entender o porquê de vários fenômenos naturais e, com isso, passar a intervir mais nos acontecimentos ao seu redor.
De fato, sem pensar, torna-se muito difícil existir e participar criticamente das discussões que rodeiam uma sociedade onde o conhecimento científico e tecnológico é cada vez mais valorizado. Sou professora de Ciências e acredito que o “ensinar para o pensar” deve fazer parte da prática pedagógica dos professores, não apenas de Ciências, mas de todas as disciplinas, desde os anos iniciais de escolaridade. Não consigo pensar na formação de um cidadão crítico à margem do conhecimento científico e do avanço tecnológico numa sociedade em que eles são imprescindíveis. Apesar da maioria da população fazer uso e conviver com incontestáveis produtos científicos e tecnológicos, pouco se pensa sobre os processos envolvidos na sua criação, produção e distribuição.
No período de 2007 a 2009, tive a oportunidade de viver uma rica experiência no Programa de Treinamento para Professores Estrangeiros no Japão. As visitas às escolas e a observação de aulas, principalmente de Ciências, serviram para aguçar meu desejo por um ensino que, mais tarde, seria denominado de “educar para o pensar”. No Japão, diferente do que eu imaginava, não se conta com tantos recursos tecnológicos na educação. Cheguei à conclusão de que é possível educar mais e melhor com os recursos que temos e, principalmente, fazer uso da nossa criatividade, do pensar. As aulas de Ciências no Japão são bastante dinâmicas e cada uma delas traz uma situação-problema que precisa ser resolvida. Os alunos são convidados a dar suas opiniões e apresentarem o conhecimento que têm previamente sobre o assunto proposto. Eles formulam hipóteses e as testam através de experimentos, que na maioria das vezes são bem simples, e pesquisa, tudo moderado pelo professor. Por fim, registram os achados e as conclusões a que chegam. Aos alunos japoneses não são dadas respostas prontas e, até onde pude perceber, há uma construção autônoma de conhecimento.
Recentemente, por conta do meu estágio de doutorado sanduíche, pude observar mais de perto cerca de 60 aulas de diferentes professores de Ciências das séries finais do Ensino Fundamental no Japão. Impressiona o percentual de aulas em que a experimentação acontece e, de novo, a forma como as aulas são conduzidas. A dúvida é uma aliada do processo de aprendizagem. Ela é percebida, hipóteses são levantadas e testadas e o conhecimento consolidado, construído através do pensar, através do existir!
Nós da RIA acreditamos e investimos nesse conceito de ensino, o de “educar para o pensar”. Temos o desejo, na teoria e na prática, de fazer com que os estudantes conquistem um pensar autônomo. Entendemos que o pensar é uma maneira de aprender, de investigar o mundo e as coisas para melhor interpretá-las. Como Immanuel Kant, outro importante e renomado filósofo, acreditamos que o conhecimento se inicia com as perguntas que fazemos à natureza. Mas que essas perguntas só surgem quando, contemplando a natureza, nos sentimos provocados por seus assombros. Ou seja, quando mobilizamos o pensar. Justamente quando existimos.
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